terça-feira, maio 31, 2011

Calendário põe obras em risco.

Cerca de 60% das obras públicas programadas para a Copa de 2014 em Curitiba e região correm o risco de não ficar prontas até o início da competição. A preocupação ganha corpo ao se observar o atual estágio das intervenções, dois anos após a capital paranaense ser oficializada como subsede do Mundial. Nove das 14 obras programadas ainda não têm projetos executivos prontos, sendo que cinco nem sequer começaram a ser elaborados. Somente uma obra efetivamente começou – a ampliação do estacionamento do Aeroporto Internacional Afonso Pena. Entre as mais importantes estão o novo terminal de passageiros do Afonso Pena e a construção do corredor metropolitano.

Os 14 projetos são de responsabilidade do Instituto de Pes­quisa e Planejamento Urbano de Curitiba (Ippuc), da Coordenação da Região Metropolitana de Curitiba (Comec) e da Empresa Brasileira de Infraestrutura Aeroportuária (Infraero). Os prazos divulgados pelo Ippuc preveem o término de seis obras ainda no próximo ano. Mas, segundo o cronograma inicial do instituto, quatro delas já estão atrasadas.

Independentemente do caminho a ser percorrido para a licitação e a execução das obras, o Ippuc defende que o prazo final é que deve ser levado em conta – e garantidamente será cumprido. Para especialistas, o cronograma apontado pelos órgãos públicos é otimista, mas não realista. “Obras desse porte normalmente levam até um ano e meio. Isso somente a execução. Se tudo correr bem, elas devem ficar prontas no final de 2013. Qualquer atraso pode comprometer tudo. Para se cumprir os prazos, vamos precisar de muita sorte”, analisa o engenheiro Valter Fanini, presidente do Sindicato dos Engenheiros no Estado do Paraná.

Flexibilização da Lei das Licitações coleciona críticas

A tentativa do governo federal de implantar o Regime Diferenciado de Contratações Públicas (RDC), por meio da Medida Provisória 521/2010, tem sido alvo de críticas de entidades como o Ministério Público Federal, Câmara Brasileira da Indústria da Construção (CBIC) e Conselho Federal de Engenharia, Arquitetura e Agronomia (Confea). A proposta, que flexibiliza a Lei das Licitações, atenderia, segundo o governo, às demandas de urgência das obras para a Copa de 2014. A oposição, que entrou no coro contra as mudanças, promete atravancar o trâmite da MP no Congresso.

Especialistas em Engenharia Civil e Direito Administrativo defendem que o RDC aumenta o risco de fraudes em obras, já que o regime proposto incentiva a realização de licitações sem a utilização de projetos completos de engenharia. O novo sistema, se aprovado, permitirá que a empresa contratada para executar a obra também seja responsável pelos demais processos preliminares, como as elaborações do projeto executivo e estudos para licenças ambientais. Hoje, para cada etapa existe uma licitação e contrato específicos. A proposta também é criticada por ter sido incluída em uma Medida Provisória que, na verdade, trata de atividades relativas a médicos-residentes e servidores requisitados pela Advocacia-Geral da União.

Para o coordenador do mestrado em Direito Administrativo da Unicuritiba, Daniel Ferreira, trata-se de uma “lei de carona”. “Está se pretendendo fazer na lei aquilo que o direito não admite. Usar para isso uma medida provisória que não tratava do assunto é uma manifestação de desespero e até de má-fé”, afirma.

Na última semana, o Instituto Brasileiro de Auditoria de Obras Públicas (Ibraop), entidade que congrega profissionais que atuam em auditoria, controle e fiscalização de obras públicas, emitiu uma carta aberta em que critica a MP. Para o presidente do Ibraop, o engenheiro paranaense Pedro Paulo Piovesan de Farias, a aprovação da proposta traria um “sério risco de obras malplanejadas, mal-executadas, com possível sobrepreço e fiscalização precária”.

Estimativas da própria Co­­mec preveem que somente a elaboração dos projetos leve de seis a oito meses. Já as licitações, tanto para contratar os projetos quanto para executar as obras, devem se prolongar por pelo menos quatro meses – desde que não haja recursos das empresas participantes, que podem estender o processo em vários meses e até anos.

“É possível terminar as obras até 2014, em termos de engenharia. Agora, depende de garantir os recursos. O que pode ser um problema, já que no caso do PAC (Programa de Aceleração do Crescimento), em geral, há um atraso de 50% em todas as obras. Sem contar as peculiariedades jurídicas que podem ocorrer. A dragagem do Porto de Paranaguá, em oito anos, não foi resolvida, por conta de entraves jurídicos”, exemplifica o engenheiro civil Ricardo Bertin, coordenador adjunto do curso de Engenharia Civil da Pontifícia Universidade Católica do Paraná (PUCPR).

Riscos

Além dos riscos durante o processo de licitação, especialistas também preveem outros problemas que podem atravancar o andamento dos serviços, como o abandono de obras por parte de empresas, escassez de materiais, falta de profissionais qualificados no mercado e necessidade de desapropriações em alguns em­­­preendimentos. A própria elaboração dos projetos executivos pode se estender, já que grande parte das obras serão feitas no meio urbano, tendo que prever interferências de redes de luz, água e energia, por exemplo.

“A etapa do projeto é fundamental. Quanto mais detalhes o projeto trouxer, mais garantia se tem que a obra possa ser executada com uma margem de valores menor. Se não for bem detalhado, na hora de executar será preciso fazer aditivos, e aí vira uma bola de neve”, avalia o presidente do Conselho Regional de Engenharia, Arquitetura e Agronomia do Paraná (Crea-PR), Álvaro José Cabrini Júnior.

A preocupação do setor é que os atrasos e o calendário apertado transformem a execução dos projetos para a Copa em um novo Pan-Americano. Em 2007, as obras no Rio de Janeiro, terminadas às vésperas da competição, custaram dez vezes mais do que o valor inicial previsto. A estimativa é que, somente em Curitiba e região metropolitana, as obras públicas custem R$ 621,8 milhões, sendo que a grande maioria dos recursos deve ser repassada por meio do PAC da Mobilidade, do governo federal.
Fonte: Gazeta do Povo 31/05/2011

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